A pandemia de Covid-19 fez com que os serviços de saúde tivessem de se reorganizar e até mesmo se reinventar. No caso da saúde mental, as demandas foram ainda mais crescentes, visto que o isolamento social agravou as situações dos usuários do serviço, por sua baixa condição econômica e muitas vezes déficit de entendimento do que vem ocorrendo. Também, os núcleos familiares disfuncionais, as dificuldades de comunicação, a falta de conhecimento, resistência e desinteresse pelo tratamento, são fatores dificultadores do tratamento e potencializadores das crises. Assim como, por conta do distanciamento social e a falta das atividades em grupos no Caps estarem temporariamente suspensas muitos familiares apresentam-se desgastados com os cuidados. De acordo com a Nota Técnica nº001/2020 – DAPS/SPS/SES de Santa Catarina as visitas domiciliares que fazem parte da rotina do serviço na modalidade Caps, também estariam suspensas, exceto nos casos de extrema urgência, o que vem sendo realizado no Caps I de Mafra SC.
O objetivo da experiência tem sido atender em domicílio as demandas urgentes de agravamento da saúde mental, com a finalidade de evitar internações desnecessárias e promover o cuidado em liberdade. Como por exemplo, nos casos pós-tentativa de suicídio, ideação suicida com planejamento, usuários do serviço que já possuem vínculo em situações de estresse, surtos delirantes sem agressividade, demandas do ministério público e conselho tutelar. A visita ocorre para que se evite que o usuário vá até uma unidade de pronto socorro ou UPA se colocando em risco e sua família em relação a contaminação pelo covid-19. Também evita-se que os casos se agravem e necessitem de internação, já que os leitos de saúde mental são raros e os esforços no momento devem ser para os atendimentos dos pacientes do covid-19.
O atendimento é realizado de maneira programada duas vezes na semana, nas quintas-feiras a tarde e sextas-feiras pela manhã, com duplas de profissionais da equipe usando o transporte do próprio Caps. Essas visitas são discutidas e planejadas na reunião de equipe que acontece na quarta feira a tarde. Primeiramente é realizada uma tentativa de atendimento telefônico ou pelas mídias sociais e somente se este recurso se esgotar ocorre a visita. No dia da visita os profissionais da equipe se paramentam conforme as normas para atendimento. O primeiro contato com o usuário se dá pelo lado de fora da casa, somente em casos extremos os profissionais entram na casa. Caso a equipe ache necessário são acionados outros dispositivos de cuidado, principalmente rede intersetorial para os que demandam da parte habitacional e social para atendimento em conjunto. Se necessário é realizado aplicação de medicamentos no domicílio conforme já prescrito anteriormente pelo médico. Em nenhum caso foi necessário acionar o serviço do SAMU.
No período de 16/03/2020 á 10/08/2020 foram realizados 45 atendimentos por meio de visita domiciliar com 7 profissionais do Caps envolvidos, entre eles: a assistente social, a enfermeira e a técnica de enfermagem, o psicólogo, a naturóloga, o terapeuta ocupacional e o médico. Apesar das visitas domiciliares terem sido realizadas para avaliação de demandas específicas focadas nos pacientes, a família muitas vezes também necessitava de atendimento, sendo beneficiada. As visitas domiciliares demandam um tempo maior dos profissionais e recursos logísticos, mas os resultados percebidos na maioria das vezes são positivos e contribuem para melhorar o tratamento dos pacientes e a qualidade de vida dos familiares. Também pudemos observar o não aumento das internações psiquiátricas.
Observou-se que as visitas domiciliares possibilitaram uma aproximação com a realidade vivida pelos pacientes e seus familiares, permitindo pensar em soluções que a comunidade pode oferecer. Além disso, este procedimento tem possibilitado a manutenção e, em certos casos, o fortalecimento dos vínculos terapêuticos, tendo em vista a continuidade do tratamento no período pós pandemia. As visitas compulsórias podem significar para os indivíduos intromissão do setor saúde, uma interferência na sua liberdade, e assim, favorecer a recusa e também denotar para o indivíduo um controle sobre suas vidas, por isso todo o cuidado deve ser tomado neste procedimento.
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