No final do ano de 2019, na cidade de Wuhan - China, verificou-se uma mutação de coronavírus – que veio a se chamar COVID-19, que logo disseminou-se por outros países, adquirindo o caráter pandêmico. Entre os diversos impactos (sociais, econômicos, etc), a sua rápida disseminação e seus efeitos sobre a população trouxeram o risco de sobrecarregar e colapsar os sistemas de saúde. A experiência dos primeiros países afetados de maneira significativa pela pandemia antecipou problemas que poderiam ser enfrentados no Brasil, assim como possibilitou planejamento de ações. Em decorrência de todos esses fatores, no Paraná, a Fundação Araucária, em parceria com a Secretaria de Saúde do Paraná (SESA) e a Superintendência Geral de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI), lançou um edital de apoio à projetos de enfrentamento à COVID-19 nas regionais de saúde do Paraná. A Unicentro, Campus Irati, foi contemplada com projeto vinculado a este edital, o que possibilitou a inserção de bolsistas extensionistas nas linhas de enfrentamento à covid-19 nas 4ª e 6ª Regionais de Saúde (RS) do Paraná. Considerando-se os impactos da pandemia sobre a saúde mental dos trabalhadores e da população, uma das ações vinculadas ao projeto desenvolvido foi a criação de uma equipe volante, voltada para o desenvolvimento de estratégias de atenção psicossocial, tendo como público alvo os trabalhadores da saúde pública dos municípios de abrangência da 4ª RS, além, da população assistida nesses municípios.
O objetivo deste trabalho é apresentar a experiência desenvolvida pela equipe volante junto à 4ª Regional de Saúde do Paraná experiência, esta, que visava a promoção de saúde mental e maior segurança no trabalho para os profissionais de saúde da APS. Pensando que as incertezas e a constante mudança de informações, naturais de uma pandemia causada por um vírus desconhecido, podem ser geradoras de sofrimento, objetivamos, além de proporcionar momentos de acolhimento e escuta, o compartilhamento de informações sobre protocolos, além de dados epidemiológicos da 4ª Região de Saúde do Paraná, com o intuito de promover, além de saúde mental, maior segurança no trabalho e consciência dos profissionais da realidade próxima, que, até então, diferia da realidade estadual e nacional.
A equipe volante é composta por duas psicólogas e um enfermeiro que atuam de forma articulada com a 4ª RS. Num primeiro ciclo das ações, realizado entre final de maio e início de julho de 2020, com foco nos trabalhadores, foi utilizada a estratégia de trabalho com grupos. As gestões dos 9 municípios da 4ª RS foram contatadas e 7 demonstraram interesse. Em cada município foram realizados, em média, 5 grupos, com foco nos trabalhadores da APS, com participação de: agentes comunitários de saúde, agentes de endemias, técnicos de enfermagem, enfermeiros, médicos, nutricionistas, farmacêuticos, psicólogos, odontólogos, auxiliares odontológicos, profissionais de serviços gerais, motoristas e profissionais administrativos. Com duração de 1 hora e 30 minutos, contou com a participação de 3 a 30 trabalhadores. O local para realização dos grupos foi disponibilizado pelas gestões municipais: serviços de saúde, auditórios ou locais arejados e amplos, possibilitando o distanciamento social e condições sanitárias. Os encontros possibilitavam um momento inicial voltado para os sentidos e ansiedades vivenciadas pelos profissionais em seus cotidianos de trabalho e um segundo momento em que discutia-se as formas de transmissão e prevenção da doença, protocolos, uso de EPI e apresentação dos dados epidemiológicos. Tentávamos, ainda, finalizar os encontros pedindo um feedback dos participantes, de forma que relatassem a significância desse espaço tanto à nível profissional, quanto pessoal.
Apesar de serem todos trabalhadores da saúde, observou-se que nem todos possuíam informações precisas sobre a covid-19. A dinamicidade epidemiológica, as novas descobertas e mudanças constantes de protocolos e estratégias de enfrentamento tornam o cenário bastante complexo. As reações psicológicas variavam desde receio e preocupação extremas em relação a covid-19 até reações de minimização ou negação dos riscos, constituindo diferentes estratégias de enfrentamento e necessidade de discussão sobre cada uma. Com a oferta dos grupos construiu-se um espaço de escuta e de formação para os profissionais, o que lhes proporcionou sentimento de amparo e permitiu, ainda, a apropriação, por de ferramentas e estratégias cotidianas para lidar com a vivência de uma pandemia, o que parece lhes ter fortalecido e proporcionado maior sentimento de segurança no local de trabalho. Ao pedirmos um retorno sobre as atividades desenvolvidas, percebemos um feedback positivo, tanto por parte da gestão, quanto dos profissionais, que encontraram no espaço oferecido um momento para discutir e compartilhar experiências e sentimentos. Percebemos, ainda, a possibilidade da formação de um vínculo entre os profissionais participantes, principalmente nos grupos onde os mesmos eram oriundos de setores diferentes, pois isso possibilitou uma maior comunicação entre eles, uma vez que percebeu-se uma sensibilização quanto ao processo de trabalho do outro, trazendo uma visão mais humanizada do mesmo.
Ao final das intervenções pudemos vislumbrar sua efetividade e como ela alcançou os profissionais tanto no âmbito profissional quanto pessoal. Após as intervenções, muitos relataram que se encontravam mais tranquilos e preparados para voltar ao trabalho, sem o temor e a incerteza que os assombrava anteriormente. Os grupos possibilitam coletivizar as experiências e proporcionar reconhecimento e amparo aos trabalhadores.Consideramos a importância de continuidade deste trabalho, que possibilitou dar vistas a pontos importantes na APS, como a comunicação entre as equipes, a relevância de todas as categorias profissionais e a importância de cuidar de quem cuida. Para desempenhar seu trabalho, o profissional deve estar bem, tanto física, quanto emocionalmente, afim de sustentar o processo de aumento de demanda no âmbito da saúde, fortalecendo a APS na direção da promoção e prevenção em saúde. Estas ações continuarão sendo desenvolvidas nos próximos meses, com novas ações direcionadas aos trabalhadores e também à população. Por fim, ressalta-se a potencialidade de parcerias interinstitucionais, articulando a universidade, as regionais de saúde e os municípios em ações integradas de fortalecimento do enfrentamento à covid-19.
Saúde do trabalhador, saúde mental, atenção primária em saúde, atenção psicossocial, COVID-19, equipe volante.