Desde fevereiro de 2020 o Município de Belo Horizonte vem se preparando para o enfrentamento da pandemia de COVID19. Diante do contágio em rápida expansão a partir de março 2020, várias estratégias de intervenção para o controle e mitigação foram disparadas. Foi publicado o plano de contingência emergencial tendo como temática prioritária o cuidado e assistência à população em situação de rua e outras vulnerabilidades, dada a especificidades desse segmento populacional cuja história de vida, modo de viver e circular pela cidade contribuem para aumento da fragilidade, vulnerabilidades sociais e suscetibilidade ao adoecimento. A contaminação e transmissão deste público é previsível, considerando as dificuldades dessa população de seguir as recomendações básicas preconizadas para a prevenção da doença, aplicáveis à população em geral, como: lavagem das mãos, uso de álcool gel e isolamento domiciliar o exercício de atividades de catação e comercialização de inservíveis, o contato constante com terceiros devido à situação de mendicância dentre tantos outros fatores. Assim, fez-se necessário além de outras ações implantar o serviço de acolhimento provisório e emergencial para pessoas em situação de rua, uma parceria entre a Secretaria Municipal de Saúde, Subsecretaria de Assistência Social e SESC Minas.
Ofertar acolhimento provisório e emergencial para a PSR com indicativo de isolamento social por suspeita de COVID-19, com quadro leve de sintomas respiratórios diminuir a circulação do vírus na cidade diminuir a morbimortalidade entre a população em situação de rua oferecer cuidado e assistência, na garantia de direitos para a PSR.
A metodologia consiste na identificação do público PSR sintomático nos diversos territórios da cidade pelas equipes do Consultório na Rua, Programa BH de Mãos Dadas contra AIDS, agentes comunitários, Serviço Especializado em Abordagem Social e rede de saúde do SUS-BH. Após a abordagem o usuário é encaminhado a unidade de atenção primária para avaliação e encaminhamento ao serviço provisório e emergencial situado no SESC/MG na regional Venda Nova. A PSR também por demanda espontânea ao procurar qualquer ponto da rede de atenção é avaliada e tendo critérios estabelecidos encaminhada a unidade. O serviço foi implantado em 06 de abril de 2020 com capacidade para atender 300 pessoas, sendo investido pela Prefeitura de Belo Horizonte R$3 milhões. No SESC o usuário permanecerá em isolamento com quarto e banheiro privativo, com oferta de cuidado de higiene, alimentação e assistência em saúde. Durante a sua permanência a equipe propicia a criação do vínculo com o objetivo de inserção após a alta, nos equipamentos sócios assistenciais da cidade. Os motivos de liberação e saída do serviço se dão por Liberação Médica (ausência de febre por no mínimo 72 horas sem uso de antitérmico, melhoria dos demais sintomas e após o período de 14 dias do início dos sintomas). O cuidado, a proteção e o isolamento social das pessoas em situação de rua que apresentam síndrome gripal devem ser assistidas pelo poder público para diminuir a possível circulação e propagação da Covid-19 na população em geral.
O serviço tem superado as expectativas, uma vez acolhe adequadamente as pessoas em um momento de fragilidade e temor, dando apoio, conforto e segurança a estas pessoas, que apesar do isolamento, não estão sozinhas. No período de abril a julho de 2020 foram acolhidas 278 pessoas. A idade média é de 40 anos, com o predomínio de homens que correspondem a 89%. Do total dos acolhidos, 34% foram encaminhados sem portar qualquer documento de identificação, o que é uma realidade deste público. A Unidade de Pronto Atendimento (UPA) foi o maior órgão encaminhador, sendo mais de 73%, seguido do Centro de Saúde (CS) com 21,56%. A maioria que acessou a UPA foi por demanda espontânea, por apresentar quadro agudo de saúde. Esses dados nos desafia pois nos mostra a importância e necessidade de potencializar o vínculo entre as equipes das Unidade de Atenção Primária e população em situação de rua. Em relação a comorbidade, 59,11% dos acolhidos não apresentou patologias (59,11%) e problemas relacionados à Saúde Mental foi a patologia mais relatada ficando acima de 8%. Um dos grandes desafios do serviço é a adesão ao período de isolamento, pois a permanência é voluntária. Do total de acolhidos, 24% evadiram, onde destes, 80% é devido a necessidade de manutenção do uso de álcool e/ou outras drogas, 10% não suportam o isolamento e 10% foram por outros motivos. Todos os acolhidos são testados com o exame RT- PCR.
O serviço vem garantindo cuidado e assistência com respeito à dignidade da pessoa humana, evitando também, a propagação do vírus nas unidades de acolhimento institucional (albergues, abrigos, dentre outros) e nas vias públicas, ampliando a oferta de cuidados básicos como: higiene, alimentação e alojamento. A participação no cuidado desta população pela atenção primária à saúde é fundamental, tanto na avaliação, como na orientação e na vigilância em saúde dessa população. A articulação com os serviços que atuam no território é relevante para garantir o acesso à assistência de forma integral, bem como emergencial que a situação de pandemia requer. O trabalho Intersetorial e interinstitucional é eficiente e a certeza que é o caminho mais apropriado na oferta de serviços públicos. A sutileza deste trabalho é a sensibilidade da gestão municipal em buscar solução conjunta e articulada junto à sociedade civil organizada e demais políticas públicas, para o enfretamento da doença considerando as peculiaridades deste grupo populacional. A APS precisa coordenar o cuidado e articular a rede de serviços conforme a singularidade de cada caso.
Covid-19 População em Situação de Rua Acolhimento Intersetorial.