O avanço mundial do contágio pela doença infecciosa viral respiratória COVID-19, provocada pelo agente Novo Coronavírus (SARS-CoV-2), ocasionou uma crise sanitária sem precedentes na história recente, dando origem a um intenso debate acerca de decisões políticas e estratégias de contenção e enfrentamento da disseminação da doença. Desde o início da atual crise sanitária, tem sido intensa a produção científica e normativa relacionada à COVID-19. Diariamente, são divulgadas inúmeras novas pesquisas e normas referentes à doença e a seus desdobramentos. Nesse cenário, os gestores públicos, sobrecarregados com o planejamento e monitoramento das ações de enfrentamento à pandemia, dificilmente têm condições de analisar com atenção e propriedade as inúmeras publicações científicas lançadas diariamente, o que acaba por ampliar as dúvidas, inseguranças e riscos inerentes aos processos de tomada de decisão em momentos de crise. Diante do exposto, o NAT da Secretaria da Saúde de Joinville/SC, vem atuando como um comitê técnico interdisciplinar de apoio ao enfrentamento da COVID-19, que passou a produzir relatórios técnicos referentes a temas relevantes para a tomada de decisão, compilando, resumindo e simplificando estudos científicos e normas nacionais e internacionais, para subsidiar e proporcionar maior qualidade às decisões tomadas pelos gestores.
O objetivo principal do projeto é o alocamento prioritário e assertivo dos escassos recursos públicos pela gestão durante a pandemia da COVID-19, para atendimento eficiente e humanizado à sociedade. A experiência utilizou relatórios técnicos sintetizados a fim de qualificar e proporcionar segurança às decisões tomadas pelos gestores da Secretaria da Saúde de Joinville/SC, oportunizando que as ações e estratégias desenvolvidas para o enfrentamento da COVID-19 estejam em consonância com as evidências científicas e com a legislação vigente. A proposta é baseada no intuito de diminuir o hiato de incertezas e tornar prática a avaliação das ações relacionadas à COVID-19, favorecendo uma maior visibilidade dos temas inerentes ao processo de gestão, estabelecendo bases seguras, do ponto de vista da saúde pública, e pautados em princípios ético-legais.
A experiência tem sido desenvolvida pela equipe do Núcleo de Apoio Técnico, que é composta por dois médicos, uma farmacêutica e dois advogados, de acordo com as seguintes etapas: a) Em discussão inicial, a equipe elenca os temas de maior relevância, considerando os relatos dos gestores e a análise da situação epidemiológica local. Aqui, ponderou-se a definição da Organização Mundial da Saúde sobre qualidade nos cuidados de saúde como “assistência do melhor cuidado de saúde possível, a partir da qual podem ser obtidos os melhores resultados para as pessoas, cada vez que necessitem fazer uso do sistema”. Nessa etapa inicial, consideramos o tema relevante se efetivamente preencher lacunas sobre cuidados em saúde; b) Realiza-se a pesquisa relacionada ao tema específico, analisando artigos científicos, documentos produzidos por órgãos nacionais e internacionais e normas jurídicas brasileiras e de outros países, de acordo com suas respectivas áreas de formação. Nesta etapa intermediária, definimos o escopo do estudo incluindo aspectos como objetivos e resultados esperados com a pesquisa, ações e intervenções de interesse e as estratégias de implementação das recomendações; e c) Para viabilizar e facilitar tal avaliação, é elaborado relatório técnico acerca do tema, que contém os resultados compilados e simplificados das pesquisas realizadas, bem como projeções de cenários para o Município e recomendações de diretrizes para as decisões a serem tomadas pelas autoridades competentes.
Até o presente momento, o comitê produziu sete relatórios, com recomendações referentes aos seguintes temas: 1) Medidas de distanciamento social; 2) Complicações de longo prazo relacionadas à COVID-19; 3) Alternativas terapêuticas para o tratamento da COVID-19; 4) Análise dos indicadores relacionados à disseminação local da COVID-19; 5) Tratamento precoce na COVID-19; 6) Risco de contágio da COVID-19; 7) Avaliação de tecnologia em saúde: câmara de ozônio para descontaminação. A resposta a uma pandemia não ocorre de modo linear. Começa mais sensível e se torna mais específica ao longo do tempo. Destarte, as pesquisas realizadas pelo Núcleo de Apoio Técnico subsidiaram as decisões dos gestores, por exemplo, quanto à escolha do modelo de distanciamento social adotado no Município. Ainda, a proposta de utilização de uma matriz de risco relacionada às diligências, indicou com clareza segmentos econômicos que devem ser priorizados na adoção de eventuais medidas preventivas. No que tange ao tratamento da COVID-19, destacou-se o desestímulo à utilização de medicamentos cuja eficácia não é cientificamente comprovada. Ademais, discorreu-se sobre a falta de evidências científicas sobre uma proposta de tecnologia em saúde inédita no Brasil, denominada câmara de ozônio para descontaminação. Por fim, salientou-se a necessidade de estruturação de serviços da rede de atenção de saúde para o atendimento das complicações de longo prazo da COVID-19.
A COVID-19, por ser uma doença ainda desconhecida em vários aspectos, gera grande impacto na sociedade. As estratégias sugeridas nos relatórios, indicam o propósito de preparar o sistema de saúde para a assistência a um grande número de casos de infectados. Portanto, destaca-se a importância de definir prioridades, baseando-se em indicadores claros e concisos. Os resultados obtidos por esta iniciativa demonstram que os processos de tomada de decisão na área da saúde pública devem ser subsidiados por robustas pesquisas e orientados por indicativos científicos, uma vez que os escassos recursos disponíveis devem ser aplicados em medidas custo-efetivas e adequadas para o atendimento da população, especialmente no contexto de incerteza e crise atual. Cumpre destacar a necessidade de produzir evidências de alta qualidade, mesmo em situação extrema como a recente, com objetivo de prestar o melhor cuidado de saúde possível. Os documentos produzidos revelam-se de grande valor ao aliar evidências científicas, que são analisadas criticamente, sintetizadas e ponderadas, com considerações jurídicas sobre a legislação vigente e demais normativas nacionais e internacionais, em conformidade à atenção em saúde.
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