A epidemia pelo novo coronavírus, iniciada na China em dezembro de 2019, ganhou rapidamente o noticiário mundial devido ao comportamento agressivo do agente etiológico denominado SARS-CoV-2, levando a grande número de pessoas internadas por insuficiência respiratória e óbitos, expandindo-se por todos os continentes até decreto de pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em março de 2020. Dados epidemiológicos preliminares indicavam que um terço da população poderia ser infectada. Destes infectados 85% seriam casos leves; 10% necessitariam de internação; e 5% de cuidados intensivos. Trata-se de situação de caráter internacional causando preocupação mundial e as autoridades sanitárias na esfera pública foram confrontadas na busca de medidas que pudessem amenizar os riscos e prejuízos à vida. A Secretaria Municipal de Saúde de Sorocaba, cidade do interior sul paulista, com população 679.378 habitantes (IBGE-2019), sendo 54% desta dependente do SUS, elaborou a partir de fevereiro de 2020, plano de contingência contra o SARS-CoV-2, formatando linha de cuidados no atendimento de síndrome gripal das unidades básicas de saúde, pronto atendimentos, unidades pré hospitalares e hospitais. Houve movimentação para a contratação de leitos hospitalares para atendimento dos pacientes com COVID-19. Os hospitais conveniados ao SUS garantiram ampliação dos leitos de UTI, havendo necessidade da ampliação de leitos de enfermaria, apontando para a abertura Hospital de Campanha.
Este documento tem como objetivo descrever sobre a implantação do Hospital de Campanha Municipal em Sorocaba, inaugurado em 25 de maio de 2020, este idealizado para ser administrado e operacionalizado pelos servidores da Secretaria Municipal de Saúde. Apresentação do protocolo de manejo clínico elaborado pela equipe gestora e de dados epidemiológicos dos casos internados no hospital no período de 25 de maio de 2020 a 31 de agosto de 2020.
Trata-se de um estudo de relato de experiência sobre a implantação e gestão do Hospital de Campanha Municipal de Sorocaba, implantado na Arena de Esportes Municipal, idealizado para atendimento de pacientes de baixa a média complexidade e dependência. Os dados epidemiológicos dos casos internados foram extraídos a partir de análise de prontuários dos pacientes admitidos no hospital, sendo analisadas, a partir de medidas de frequência absoluta, as variáveis sexo, presença de comorbidades, principais comorbidades apresentadas, percentual de casos confirmados para COVID-19, evolução dos casos e média de idade e período médio de permanência dos pacientes durante a internação. Os protocolos assistenciais foram desenvolvidos a partir de dados publicados na literatura sobre o tema e da análise de protocolos assistenciais de hospitais de referência.
Implantação iniciada pela contratação de empresa para estruturação do local, com projeto contemplando área administrativa, técnica e assistencial com 9 leitos de estabilização, 75 leitos de enfermaria e dois postos de enfermagem. Contratação de terceirizadas para serviços dietéticos, higienização, lavanderia, radiologia e laboratório clínico. Demais serviços executados por equipe de servidores municipais, sendo estes médicos, enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas, farmacêuticos e pessoal de segurança. A equipe assistencial recebeu treinamento teórico e prático sobre o protocolo de conduta elaborado, rotina de trabalho estabelecida, assistência ventilatória e uso de equipamento de proteção individual. O protocolo assistencial teve base de tratamento com oxigenioterapia, uso de antibióticos, corticosteroides e enoxaparina em doses ajustadas a partir da análise de fatores de risco para eventos tromboembólicos, além de assistência fisioterápica através de protocolos de assistência ventilatória e de posicionamento no leito. No período foram internados 374 pacientes, idade média 54 anos, 56% sexo masculino, 78% com comorbidades, maior ocorrência de hipertensão e cardiopatias (57%). Confirmação laboratorial para COVID-19 em 77,8% dos casos, sendo 70% dos confirmados por técnica de PCR. No desfecho dos casos ocorreram 4 óbitos (1%), 30% dos casos transferidos para unidades de terapia intensiva e 69% dos pacientes tiveram alta após tempo média de permanência de 7 dias
A decisão da equipe gestora pela operacionalização do Hospital de Campanha com servidores públicos municipais envolveu todos os setores da Secretaria Municipal de Saúde, sendo necessária a integração das ações a fim de garantir a manutenção dos serviços da atenção primária ao atendimento hospitalar terciário. Cerca de 25 % dos servidores se mobilizaram voluntariamente para o trabalho, os demais, após convocação. Incertezas sobre risco ocupacional, condições de trabalho e capacidade técnica pessoal foram os motivos apontados pelos profissionais durante treinamento admissional. No período desenvolveu-se ações de humanização e empatia por parte da equipe assistencial aos pacientes, que se traduziram em manifestações de agradecimento e valorização dos servidores públicos e profissionais da saúde. A gestão direta do hospital por parte da equipe da Secretaria Municipal de Saúde em detrimento da contratação de serviços, otimizou a gestão de pessoas, de recursos e consequentemente de resultados, não tendo sido observado saturação absoluta de leitos e observado queda na letalidade após o início das atividades. A valorização do SUS e dos funcionários que trabalham no sistema é um legado deste momento crítico.
Hospital de Campanha; Servidores Públicos Municipais; Protocolo Assistencial COVID-19; Perfil de Pacientes Internados;