A dependência química, na história da sociedade, era pautada na lógica da criminalidade e periculosidade, tendo a punição e o isolamento em manicômios como única forma de cuidar, objetivando a abstinência. A partir da Reforma Psiquiátrica e com a instituição da Política de Redução de Danos, o acesso aos serviços de saúde pelas pessoas com dependência química tornou-se um avanço dentro da Saúde Pública. A garantia do acesso aos serviços de saúde possibilitou um olhar humanizado para a compreensão das questões que levam a inserção desses sujeitos na relação de dependência com a droga, deixando-os em situação de vulnerabilidade e risco social, na grande maioria das vezes. Como equipamento da RAPS, os Centros de Atenção Psicossocial para álcool e outras drogas – CAPSad, oferecem a atenção de forma singular, observando cada sujeito para a construção de seu projeto terapêutico singular, visando o acolhimento de suas demandas e a possibilidade de maior resolutividade de questões físicas, psíquicas, emocionais e sociais. Hoje, vive-se uma realidade onde a dependência química traz para nossa Rede de Saúde pessoas em situação de rua, indivíduos com elevados riscos e vulnerabilidades para a infecção pelo COVID-19. A realidade dos cinco primeiros meses da pandemia no CAPSad Estação Vicente Araújo - Recife-PE, incentivou os trabalhadores à criação de novas estratégias de abordagens e cuidados, garantindo, assim, a continuidade do acolhimento e a escuta individual.
• Demonstrar como ocorreu a reorganização para garantir a continuidade ao cuidado dos usuários em tempos de pandemia • Compartilhar novas formas de atuação na saúde mental diante de medos, incertezas e angústias, frente ao atual cenário epidemiológico • Evidenciar o êxito na continuidade no tratamento dos usuários na perspectiva da integralidade e equidade • Mostrar a capacidade da equipe na readequação dos espaços e das práticas para garantir acolhimento com segurança para todos • Compartilhar as estratégias utilizadas no incentivo ao autocuidado e o cuidado com o outro de maneira preventiva e/ou curativa • Evidenciar as abordagens de orientação bem sucedidas em relação às formas seguras para uso de substâncias minimizando os riscos de infecção pelo COVID-19.
A partir das orientações das autoridades sanitárias, o serviço se reorganizou para garantir o acesso dos usuários nos três turnos, com técnicos atuando em sistema de plantões, possibilitando maior segurança para todos. Continuou-se a oferta de refeições, cuidados de higiene, consultas clínicas e psiquiátricas, atenção à crise, dispensação de medicações, atendimentos individuais e a familiares por equipe multiprofissional, visitas domiciliares, acolhimento a novos usuários, garantindo “porta aberta”. Para além das ações dentro do serviço, permaneceram as articulações com a Rede de Assistência, incluindo os Leitos Integrais, UPAs e as Unidades de Referência para COVID-19, utilizando equipamentos do território, como Atenção Básica e o Consultório de Rua, com o suporte da Coordenação Distrital e da Supervisão Clínica, garantindo a discussão de casos. A equipe também se mobilizou para conseguir doações de máscaras, entregues aos usuários como estratégia de proteção, orientando-os com conversas circulares - sempre mantendo o distanciamento social, tirando dúvidas sobre a pandemia. Munindo-os, assim, de informações para envolvê-los no cuidado e proteção consigo e com o outro, abarcando também questões inerentes ao uso de substâncias químicas, compartilhamento de drogas e utensílios para uso. Também houve o foco em ações de acolhimento, referenciamento dos que estavam em situação de rua para abrigos municipais, bem como garantia de cuidados de higiene pessoal e de seus pertences.
Das ações que foram realizadas durante a pandemia, no período de março a julho do corrente, contabilizou-se o total de atividades realizadas, de refeições ofertadas e usuários que foram atendidos pela assistência farmacêutica, garantindo o cuidado em saúde de forma integral. Foram: 358 Grupos de Orientações, 661 Acolhimentos, 2620 Atendimentos Individual, 686 Atendimentos a Familiares, 206 Atendimentos Psiquiátrico, 376 Atendimentos Clínico, 4924 Refeições Ofertadas (café da manhã, almoço e jantar) Dispensação de Medicações para 623 usuários, 44 Atendimentos de Atenção a Crise, 475 Articulações de Rede, 205 Ações de Redução de Danos. Apesar do novo formato de funcionamento, em decorrência da pandemia, a continuidade dessas ações, possibilitou o fortalecimento de vínculo de nossos usuários com a equipe e com o serviço, assim como uma nova forma de ressignificar o cuidado na saúde, e em especial na saúde mental.
Trabalhar na perspectiva da priorização do cuidado e valorização da singularidade dos usuários, buscando garantir a assistência e dando resolutividade para as demandas trazidas pelos mesmos, possibilitou observar o potencial de readequação da prática na assistência ofertada num serviço de saúde mental, como também o entendimento de que a saúde precisa de atenção integral e ao mesmo tempo de forma articulada no território para potencializar as ações na garantia do direito à saúde. Salientando, assim, o exitoso trabalho de uma equipe multidisciplinar, em uma perspectiva de interdisciplinaridade, em contexto de pandemia, no SUS.
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